Despedida
DESPEDIDA
Chegara, enfim, o dia da despedida.
Tudo e todos ficariam para trás.
Seu mundo, em pouco tempo, seria totalmente diferente.
Emoções conflitantes povoavam seu peito.
Por um lado, uma sensação de alívio.
Por outro lado, no entanto, sentia que estava perdendo muito.
Olhava as paredes, a mesa, o armário......
Pegou alguns documentos e fitou-os por alguns instantes.
Por vários anos eles fizeram parte de sua rotina.
Dentro em pouco eles sumiriam de sua vida como que num passe de mágica.
Outros papéis, com objetivos totalmente diferentes, assumiriam o lugar destes.
Foi ao bebedouro. Enquanto sorvia a água que jorrava, filosofou:
“amanhã estarei bebendo água de uma outra fonte”.
No decorrer do dia fitava cada rosto que cruzava seu caminho.
Estava como que gravando cada contorno, cada expressão, cada detalhe....
Ia deixar uma porção de colegas. Ficaria para trás uma porção de amigos.
Tinha uma sensação de que demoraria muito tempo para rever aqueles rostos amigos.
Talvez jamais os veria novamente!
Ficou pensando nos semblantes novos que fariam parte de sua vida a partir do dia seguinte.
Como seriam? Alegres? Sérios? Carrancudos? Amigáveis? Tristes?
Tomou um café. “Meu último café”, pensou.
O que deveria sentir com tudo isso? Não tinha a menor idéia!
Na hora do almoço, como era seu costume, foi dar um passeio. “Meu último passeio”, falou para si mesmo.
À tarde a sensação de perda foi ficando cada vez mais profunda.
Sabia que a hora da despedida não tardaria, aliás chegou bem mais cedo do que imaginava.
Alguns amigos entraram até sua sala com um presente de despedida. Aquilo foi comovente.
A sensação de que estava abrindo mão de coisas valiosas voltou a rondar seus pensamentos.
Passou-se algum tempo e outros amigos vieram com um outro presente de despedida.
Fez um esforço extremo para não deixarem perceber a emoção que fervilhava em seu íntimo.
Enfim chegou o momento da despedida. Fez questão de despedir-se pessoalmente de todos.
Foi de mesa em mesa despedir-se deles. Amigos novos e velhos. Muitos eram recém-chegados, mesmo assim fez questão de despedir-se de todos.
Cada cumprimento, cada abraço, cada despedida, era especial, muito especial.
O coração acelerava. O peito apertava. Estava chegando a hora!
E a hora chegou. Depois das despedidas, o momento de ir embora.
Não quis dar uma última olhada no prédio. Já sentira muita emoção naquele dia.
Andou rápido, sem olhar para trás. Sabia que atrás de si estavam muito mais do que coisas.
Deixava para trás pessoas. Não, não eram apenas pessoas.
Deixava para trás amigos. Não, não eram apenas amigos.
Deixava para trás vidas.
Deixava para trás amizades.
Deixava para trás convivências.
Deixava para trás experiências compartilhadas.
Deixava para trás preciosos anos de sua vida.
Deixava para trás emoções... fortes emoções!
Enquanto caminhava encontrou, no canteiro que separa as pistas da avenida, uma flor.
Estava murcha. Quão coincidente!
Chegou à estação do metrô.
Um trem estava na plataforma.
Correu para não perdê-lo.
Sentou no seu canto preferido.
Soou a campainha de segurança.
As portas se fecharam.
A composição partiu.
Acabou!
Roberto Policiano
4 Comments:
A partir desta semana publicarei crônicas e poemas alternadamente. Esta é a primeira crônica da série.
O tio,
A primeira vez que você postou essa crônica foi durante a última semana do meu estágio.... veio a calhar.
Parabéns!!!!
Rui, no início pensei: deveria chamar-se aposentadoria. Daí reconheci sua pessoa naquela história e percebi que despedidas acontecem de várias formas. E aliás devem acontecer todos os dias, pois a gente nunca sabe quando será nosso último.
oi Rui. O relato da sua despedida do Iprem me faz lembrar da minha aposentadoria. Preciso me concentar nas coisas boas que farei depois para não sentir que vou perder algo.O ano que vem terei novo espaço na minha vida. Gostou?
Ciao. Rosa.
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