Ela andou cabisbaixa até um banco de uma praça e sentou. Seu rosto estava banhado de lágrimas. Seu olhar estava opaco. Sua fisionomia era sombria. Suspirou profundamente. A natureza em sua volta, ao notar tamanha tristeza, procurou desesperadamente ajudá-la. Um pássaro corajoso pousou no encosto do banco e assobiou uma alegre canção numa tentativa de amainar a sua dor. Embora o coitadinho assobiasse tanto a ponto de perder o fôlego, não conseguiu arrancar a tristeza do coração daquela sofredora, pois a tristeza a deixara surda! Um gato saiu de um tronco oco, que estava tombado a alguns metros de distância, e, chegando perto dela, ronronou incansavelmente, enquanto passava por entre suas pernas. Embora não obtivesse o resultado desejado, não quis deixá-la sozinha e enrolou-se em volta dos pés da menina, achando que, se ela sentisse o calor de seu “abraço”, poderia sentir-se melhor. Mas a tristeza deixou o coração dela tão gélido, que não sentiu aquele “abraço”! Um casal de beija-flores executou uma infinidade de acrobacia em frente dela, mas foi tudo em vão, pois a tristeza cegou-a completamente! Antes de irem embora, porém, cada um deles sorveu uma lágrima que corria, como que a enxugar o seu pranto. Um novo suspiro ecoou no ar. Uma nova enxurrada molhou o seu rosto. O pássaro corajoso, recuperado do insucesso inicial, voltou com mais seis pássaros que, representando todas as notas musicais, pousaram no encosto do banco e iniciaram uma linda apresentação canora. Uma borboleta monarca, como que dançando ao ritmo daquela orquestra, rodopiou graciosamente diante da menina por alguns minutos e, ao se sentir exausta, pousou delicadamente sobre um dos seus joelhos e ficou, ora com as asas abertas, ora fechadas, fazendo companhia a ela. E vieram grilos, gafanhotos, mariposas, joaninhas, e tantos, tantos outros insetos, que é impossível escrever sobre todos eles. Todos fracassaram! Mas a natureza não desistiu e enviou um cordeirinho, branquinho como a neve, que pulou ao lado da infeliz e, ficando bem pertinho dela, passou sua cabeça por baixo de suas mãos e ficou a mendigar um carinho. Não ficou magoado quando o carinho não veio. Apenas deixou sua cabeça encostada no ventre da coitada e, fechando seus olhinhos, ficou bem quietinho compartilhando o calor de sua lã com ela. Terminada a vez do cordeirinho, dois filhotes de lobo entraram em cena e fizeram tudo que estava ao alcance deles para amainar aquela tristeza. Numa tentativa mais agressiva, cada um deles agarrou uma das barras da calça da desconsolada e, dando pequenos e insistentes puxões, tentou acordá-la para fazê-la ver que todos torciam por ela. Vencidos pelo cansaço, os dois filhotes pularam em cima do banco e ficaram do lado oposto ao do cordeirinho, com as cabecinhas deitadas sobre as pernas daquela menina. Uma hiena, que observava tudo por trás de uma moita, quis rir da cena, mas um dos beija-flores que tentou alegrar a moça pousou corajosamente diante da fera e, com as asinhas na cintura e um pezinho batendo insistentemente no galho onde pousara, passou-lhe um psitií assim: “psitiiiiii, psiiiiiiiti, psiiiiitiiiii!”, que, traduzido, quer dizer: “você não percebe que a nossa irmãzinha está tristonha?”. Sim, irmãzinha, disse o beija-flor, porque, embora raramente nos lembramos que somos parte da natureza, a natureza jamais se esquece que somos parte dela! A hiena, envergonhada, abaixou a cabeça, colocou o rabo entre as pernas e tratou de sair de fininho! O sol, que assistia toda aquela dedicação, resolveu contribuir e, brilhando como nunca tinha brilhado antes, dirigiu seus raios solares no rosto da nossa amiguinha, achando que com isso secaria suas lágrimas. O astro rei fez tanto esforço para irradiar aquele brilho, que ficou vermelhinho, vermelhinho. Várias nuvens que estavam esparramadas na imensidão do céu, quando perceberam a razão do tamanho esforço do sol, vieram testemunhar de perto tamanha tristeza. Ficaram tão juntinhas e tão coladinhas umas às outras, que se transformaram numa densa nuvem! O sol, sentindo-se fracassado em seus esforços, escondeu atrás naquela nuvem recém-formada. A nuvem ficou tão tristonha com a tristeza que assistia, que não conseguiu conter suas águas. E então a natureza chorou de tristeza! Anoiteceu. Vários pirilampos rodearam nossa amiguinha e, numa coreografia jamais vista antes, criaram o maior caleidoscópio do mundo, mas nossa amiguinha nem notou! Quando as estrelas ficaram sabendo através das andorinhas o que estava acontecendo, fizeram um pacto entre elas e, num esforço conjunto, brilharam e piscaram como nunca fizeram antes. A lua querendo dar sua contribuição, enviou tanto dos seus raios para a terra, que aquela noite, por alguns minutos, ficou tão clara quanto o dia. Nenhum animalzinho se recolheu naquela noite. Todos ficaram, ou dos galhos onde pousavam, ou da entrada de suas tocas, ou ainda escondido entre as moitas, com seus olhinhos bem abertos para presenciar qualquer reação positiva. Qual o quê! Depois de todos se esforçarem tanto para alegrá-la, a menina se levantou e, num suspiro profundo, deixou cair mais algumas lágrimas e saiu cabisbaixa. Todos iam entregar-se ao mais sentido dos choros que já se ouviu, mas a velha e sábia coruja, batendo uma asa na outra, chamou a atenção de todos. Ela, como era muito respeitada, conseguiu a atenção que queria. Neste momento a natureza, pela primeira vez, ficou sem dar nenhum pio! E a sábia coruja ensinou:
- Não se desesperem, meus amiguinhos, vocês não são culpados, pois, quando uma pessoa está extremamente triste, fica surda e cega e o único sentimento que consegue demonstrar é a tristeza. Por mais que tentamos fazê-la feliz, não conseguimos fazer com que ela enxergue nem ouça nossos esforços. Mas não se preocupem! Ela não ficará assim para sempre. Alguma coisa ou alguém vai fazê-la sorrir novamente. Aí então ela vai olhar para trás e agradecer todos os esforços que vocês fizeram por ela.
Então, a pedido da coruja, os pássaros mais velozes voaram em direção à lua e às estrelas para pedirem a elas que não brilhassem naquela noite. Enquanto isso, os outros pássaros voaram até as nuvens que estavam espalhadas pelo céu, pedindo que elas se unissem para criar a maior e mais a densa nuvem de todos os tempos. Dizem que aquela foi a noite mais escura que já houve no planeta terra!
Roberto Policiano