Roberto Policiano

28 de jan. de 2011

Obstáculo



Oito horas da manhã. O trem chega numa das estações principais da cidade, onde cinco linhas de trens se encontram. O movimento é intenso quase que constantemente, pois há sempre um trem chegando e, conseqüentemente, passageiros apressados cruzando-se entre si em direção a outro trem ou às saídas da estação é uma visão comum. O movimento das massas lembra o vai e vem das ondas do mar em período de agitação. É preciso andar rápido ou dar passagens a fim de sair ileso de todo aquele frenesi. Porém, uma passageira, violando a lógica do local, andava tão sossegada que chamou a atenção daqueles que observavam a multidão da plataforma de cima, cujo espaço não fazia parte da rota de passageiros apressados. Era como se ela estivesse passeando num dos shoppings da cidade encantada com as mercadorias expostas nas vitrines. Como se isso fosse pouco, parou de repente e, tirando o celular da bolsa, atendeu a um chamado. Esta ação fez com que ela diminuísse o passo ainda mais até parar por completo. Naquele momento a multidão raleara, pois passavam os últimos passageiros do trem. Alguns minutos depois, no entanto, uma nova composição despejou seus passageiros na plataforma. Logo enxurradas de pessoas surgiram de todos os corredores que levavam ao pátio principal. Alguns instantes se passaram e um verdadeiro tsunami vivo podia ser observado de cima. Nossa heroína, absorta do assunto da ligação, continuava parada no meio do caminho. A multidão apressada, assim que se deparava com aquele obstáculo, tinha que diminuir abruptamente a marcha e mudar de direção a fim de não atropelar a campeã da distração. Observada de cima a cena lembrava um rio com uma pedra em seu leito obrigando suas águas a se dividirem para seguir caminho. De repente os comentários de todos os observadores giravam em torno do acontecimento. As mais maravilhosas expressões de espanto puderam ser ouvidas por aqueles que presenciavam aquele espetáculo. E, por incrível que pareça, contrariando a todas expectativas, nossa distraída saiu ilesa da situação.

Roberto Policiano

21 de jan. de 2011

Espera



Não devo ser apressado,
Mas esperar minha vez.
Se não tiver alcançado
Aguardo passar um mês.

Talvez espere um semestre,
Ou, se cometi um engano,
Em vista de eu não ser mestre,
Pode demorar um ano.

Quem sabe, dez, vinte anos,
Às vezes até bem mais,
Tempo algum vai me deter.

A quem eu há tempo amo,
Na vila, no campo, ou cais,
Ao meu lado eu hei de ter!


Roberto Policiano

17 de jan. de 2011

Zona Proibida



É o ano 2987. O planeta Terra está bem diferente. Em virtude do aquecimento global as calotas de gelo polares derreteram-se, fazendo com que novas terras se tornassem disponíveis para a humanidade. Em vista disso a nação que domina o mundo é a Finlândia. Sua rainha se tornou a mulher mais poderosa de todos os tempos. O avanço tecnológico permitiu que os terráqueos visitassem outros planetas, não só do Sistema Solar, nem tampouco apenas da Via Láctea, mas de várias galáxias. Muitos planetas habitados foram descobertos, e o contato com outros povos tornou possível o acesso a novas tecnologias e materiais até então desconhecidos pelos habitantes de nosso planeta. O problema da falta de água foi resolvido quando foram localizados vários planetas que nada mais são do que depósitos inesgotáveis de água. É comum espaçonaves tanques, capaz de conduzir bilhões de litros de água, cruzarem a atmosfera terrestre. Foi isso que salvou grande parte da África, das Américas da Ásia e do Oriente Médio, que se tornaram o celeiro deste planeta. Já não se vê mais carros nem qualquer outro meio de transporte circulando na superfície da Terra. Os veículos, no entanto, continuam, numa quantidade jamais imaginada, a serem visto em toda a parte, só que agora no espaço aéreo. As ruas transformaram-se em imensas plantações, que são cuidadas em sua totalidade por robôs de diversas formas e tamanhos diferentes. A população atual é de cerca de quarenta e cinco bilhões de pessoas. As viagens intergalácticas é um procedimento comum. As casas deixaram de existir a muito tempo. Grandes conglomerados habitacionais flutuantes substituíram as antigas moradias. A rainha finlandesa, Sua Majestade Genoveva XVII, comanda a maior potência financeira de todos os tempos. Grandes frotas de espaçonave mercantes cruzam os céus do planeta diariamente trazendo e levando preciosos produtos, tornando a Finlândia uma nação cada vez mais rica. Com nova tecnologia e novos combustíveis adquiridos de habitantes de planetas de outras galáxias, as espaçonaves conseguem viajar a uma velocidade várias vezes maior do que a velocidade da luz. ‘Túneis de Vácuo’, que por séculos foram confundidos com buracos negros, foram descobertos pelos Astrônomos, o que permitiu viagem entre as galáxias com duração de apenas alguns meses. Descobertas promissoras apontam para a possibilidade de que tais viagens sejam realizadas em apenas um quinto desse período. Tudo isso contribuiu para a troca de experiências e tecnologia entre diversos povos cujos indivíduos, diferente do que se imaginava antigamente, pouco tinham de diferentes dos terráqueos, tornando impossível, nas convenções que aconteciam com regularidade, tanto no planeta Terra como em outros lugares do universo, distinguir a origem dos presentes a menos que os mesmos se identificassem. A expectativa de vida dos humanos ascendeu muito nos últimos trezentos anos, a ponto de ser comum encontrar pessoas em pleno vigor físico e mental com seus quase quatrocentos anos de vida. Muitos súditos servem Sua Majestade já por décadas. Entre eles figuram Nygerym e Kalcasyna, engenheiro e engenheira de viagens intergalácticas da mais alta confiança da rainha. Em uma de suas missões, cujo objetivo era estabelecer comércio com povos de planetas de certa galáxia distante, os dois experimentavam novas rotas de viagens através dos ‘túneis de vácuo’ ainda não trafegados por espaçonaves usadas pelos terráqueos. Eram comuns expedições de exploradores com o objetivo de descobrir novos caminhos, mas este não era o caso dos dois servidores. Mesmo assim, em determinado momento da viagem, os dois depararam com um destes túneis que não estavam registrados no ‘plano de rotas possíveis’, documento muito usado pelos viajantes intergalácticos. Como a missão previa tais possibilidades, eles resolveram conhecer esta parte do universo ainda não catalogada, pois não havia nenhuma informação que outros povos conheciam aquele lugar.
Depois de uma viagem de três semanas explorando o novo caminho os viajantes se depararam com um sistema planetário totalmente incomum, assim, resolveram investigar um de seus planetas. O que eles viram é indescritível. Era tão espetacular e singular que era difícil para eles acreditarem no que se apresentava diante deles naquele ambiente tão especial. Foi uma experiência única para ambos. Jamais, tanto na vida do Nygerym quanto na da Kalcasyna, aconteceu algo tão fantástico. Uma emoção, ainda não sentida por nenhum dos dois, alcançou a cada um dos viajantes. Era como se o planeta os convidasse a permanecerem naquele planeta exuberante para sempre. Plantas e animais, totalmente desconhecidos por todos os povos que mantinham contato com os terráqueos, exibiam sua beleza, cor, forma e perfume. Os dois engenheiros exploraram todo o planeta num período de três meses, mas não encontraram nenhum habitante inteligente que pudessem manter contato. Quanto mais permaneciam ali, mais a emoção dominava a cada um deles. A vontade de permanecer naquele lugar era imensa, mas havia a lealdade à Sua Majestade que os impediam. A luta entre ficar ali e reiniciar a viagem era enorme. Um misto de sentimentos conflitantes atormentavam cada um deles. Embora embevecidos pela emocionante experiência, a lealdade à rainha por fim prevaleceu e os dois, cabisbaixos, abatidos e sentindo-se eliminados por dentro, resolveram deixar o lugar e seguir viagem. O restante da missão foi tão triste e sem graça que não faz sentido comentar.
Três anos depois, com um acordo comercial bastante interessante em sentido financeiro e tecnológico, os dois se apresentaram à Sua Majestade, a rainha Genoveva XVII, que, como reconhecimento pelos serviços prestados à coroa, recompensou a cada um dos súditos. Depois de uma longa e merecidas férias cada um deles foi designado para comandar uma missão diferente em pontos oposto do universo, mantendo-os distantes em milhares de anos-luz. Quanto ao planeta descoberto pelos dois, por não ter sido catalogado nos anais das viagens espaciais, ficou esquecido em um ponto qualquer do universo como se fosse uma Zona Proibida.
Roberto Policiano

7 de jan. de 2011

Presente



Nunca jogue fora um poema;
Guarde-o, pois ele não ocupa espaço,
pelo contrário, amplia-o!
Qualquer verso,
por mais singelo que seja,
deve ser preservado.
Talvez, como uma gema,
espera por outros versos, que,
unidos, formarão uma bela jóia.
Ou, quem sabe, ele será apenas
uma ‘pedra solitária’ que
fornecerá seu brilho e elegância,
enfeitando uma passagem
de tua vida ainda por vir.
Um verso que nasce é um presente,
receba-o!
Talvez seja uma semente que,
no clima e no solo propício,
Germinará e te surpreenderá.


Roberto Policiano