Roberto Policiano

12 de jun. de 2013

Tio Bento





Dezessete horas e quarenta e cinco minutos. A campainha soa. Rosinha vai atender. Ao abrir a porta e olhar para o portão, um desânimo toma conta imediatamente dela. Era o tio Bento que chegava. Um segundo e alguns centésimos depois se recompôs e foi em direção à visita. Cumprimentos de praxe e o convite para entrar. Já na sala uma poltrona é indicada e o recém-chegado a ocupa. Alguns minutos depois uma xícara de café é serviço, acompanhada de biscoitos de amigo de milho. As novidades são colocadas em dia entre uma bebericada na bebida e uma mordiscada na guloseima. A pequena Adelaide, de apenas três anos de idade, entra na sala e, depois de cumprimentar o tio avô com um beijo no rosto e se incomodar com a barba por fazer - que o parente insistiu em esfregar no rosto da garotinha - escapa do sacrifício e senta-se ao lado da anfitriã. Terminada a introdução de praxe o visitante iniciou sua longa lista de reclamações de pessoas com quem tem contato. Em casa tem problemas com diversos membros da família; na região onde mora alguns vizinhos o perturbam; frequenta uma associação cultural, mas está prestes a abandonar porque algumas pessoas são insuportáveis demais; no emprego alguns colegas de trabalho tentam escorar nele e o chefe não toma nenhuma providência para resolver a situação... Nisto a garotinha teceu o seguinte comentário:

- Como o senhor é azarado, tio Bento! Em todo o lugar onde o senhor está tem sempre alguém incomodando o senhor. Parece que o senhor não tem sossego, não é mesmo?

O homem respondeu com um sorriso forçado e alguns murmúrios e, talvez intimidado pelo comentário inocente da sobrinha, ficou mais alguns minutos e, movido por uma lembrança conveniente de uma obrigação inadiável, despediu-se e seguiu seu rumo.

Enquanto caminhava em direção ao seu lar o comentário da criança continuava a gritar em sua mente. “Onde o senhor está...”; “Onde o senhor está...”; “Onde o senhor está...”; “Onde o senhor está...”. Em meio a tal “gritaria” um “cochicho interior”, embora baixo, prevaleceu sobre o falatório. Chegou a casa determinado a reavaliar suas impressões.


Roberto Policiano