Roberto Policiano

29 de jan. de 2014

Marcenaria



Em sua marcenaria

Coberto de pó de serra

Pensava em Márcia Maria.

 

Domingo desceu a serra

Foi a casa à beira-mar.

Que é o mar sem Maria?

 

À tarde, no frio do outono,

Foi vencido pelo sono;

Sonhou que Márcia ao mar ia.

 

Enquanto rasgava entalhes

Pensava em cada detalhe

Do amor à Márcia Maria.

 

Mar, serra, Márcia Maria,

Giravam em sua cabeça

Naquela marcenaria.

 

Roberto Policiano

22 de jan. de 2014

Equívoco




Naquele dia dera sorte, pois conseguiu sentar para a viagem matinal até o seu local de emprego. Mal comemorava seu achado, no entanto, chegou uma mulher que aparentava uma gravidez já no terceiro mês. Assim que a avistou levantou-se imediatamente e ofereceu-lhe o lugar, mas a oferta foi polidamente rejeitado. No entanto ele insistiu que ela sentasse e, mais uma vez, ela declinou do convite. Cumprindo seu papel de cavalheiro ele não aceitou um não como resposta e insistiu até que, por fim, ela aceitou o lugar com um sorriso forçado de agradecimento. Para deixá-la à vontade ele, depois de disfarçar por alguns segundos, se retirou do lugar, ocupando um espaço no corredor cerca de quatro metros longe da senhora. Sentiu-se bem consigo mesmo por ter notado o estado da passageira, embora o ventre dela estivesse apenas sutilmente aumentado. Aquela sensação de dever cumprido o acompanhou até a estação onde desembarcara. Caminhava feliz da vida. “Como uma boa ação tem um efeito agradável!”, pensou. Pouco depois percebeu que a senhora também descera naquela estação. Como estava com mais pressa do que ele, a distância entre os dois aumentou gradativamente até ela desaparecer de sua vista no meio da multidão que seguia apressada para seu destino.
              Desde então a tem visto na condução com certa regularidade. Percebe que ela fica sem graça quando o vê, portanto, procura ser o mais discreto possível.
              Tudo aconteceu dentro da normalidade, com exceção de um pequeno e sutil detalhe – quatro semestres depois ela ainda continuava aparentando uma gravidez de três meses!
 

Roberto Policiano

15 de jan. de 2014

Semeadura




Seja onde for

Somente semeie

A semente do amor.



Roberto Policiano

8 de jan. de 2014

Balão Murcho



Foi numa tarde de sábado. O sol estava abrasador, mas uma brisa agradável temperava o ar. Caminhava ao lado de uma avenida movimentada. Sua atenção foi voltada para uma bexiga de borracha colorida que rodopiava na calçada, mas não levantava voo. Diminuiu o passo e parou a fim de examinar melhor o caso. Percebeu que o balão de ar não estava sozinho, mas preso por um barbante a outro que murchara. Este último impedia que o primeiro ganhasse altura embora se sacudisse para lá e para cá em rodopio, numa tentativa de escapar daquele que o mantinha preso ao chão. No entanto, rejeitando aquela posição de estagnação, continuou a tentar a alcançar a liberdade até que estourou quando sua pele frágil foi arranhada por uma pequenina pedra. E o outro, murcho, sem se dar conta de ter se tornado um empecilho para seu companheiro alçar a liberdade, continuou inerte e sustentando em si os farrapos do que sobrara do outro! O transeunte ficou em pé por alguns minutos observando o barbante que prendia as duas bexigas. De um lado, fiapos daquele que pretendia alcançar os céus, do outro uma borracha murcha que não tinha pretensão de sair do chão e cujo peso impediu seu companheiro de viajar nas asas da brisa.


Roberto Policiano

1 de jan. de 2014

Linha do tempo - III





Os dias passam depressa,

De repente finda o mês,

E com isso vai-se um ano;

Fizeste cinquenta e seis!

Cinquenta e seis, meu velhinho,

Cinquenta e seis,

E com isso vai-se um ano

Fizeste cinquenta e seis.

 

Tua data de nascimento, meu nono,

Chegou outra vez,

Não tem choro e nem lamento, meu velho,

Fizeste cinquenta e seis!

Cinquenta e seis, ex-menino,

Cinquenta e seis,

Não tem choro e nem lamento, meu velho,

Fizeste cinquenta e seis.

 

Tires o sapato, descanses,

Chegou a tua vez,

Não te esqueças deste lance, velhinho,

Fizeste cinquenta e seis!

Cinquenta e seis, ex-garoto,

Cinquenta e seis,

Não te esqueças deste lance, velhinho,

Fizeste cinquenta e seis.

 

Compadre, penses comigo

Com nitidez,

Lembro-te como a um amigo,

Fizeste cinquenta e seis!

Cinquenta e seis, camarada,

Cinquenta e seis,

Lembro-te como a um amigo,

Fizeste cinquenta e seis.

 

Sem algazarra, sem farra,

Prestes atenção,

Com cinquenta e seis nas costas,

Cuides de teu coração!

Cinquenta e seis, ex-mocinho,

Prestes atenção,

Com cinquenta e seis nas costas,

Cuides de teu coração.

 

Tenhas cautela, noninho,

Não pintes o sete,

Faças o que de ti se espera

E farás cinquenta e sete!

Cinquenta e seis, meu noninho,

Não pintes o sete,

Faças o que de ti se espera

E farás cinquenta e sete.


Roberto Policiano