Privilegiados
Doutor Fábio e a família, depois de passar um final de semana prolongado num hotel de luxo numa cidade litorânea, preparava-se para fazer a viagem de retorno. Com a família bem acomodada em seu Mercedes equipado com ar condicionado e demais comodidades que garantiria uma viagem confortável, deixaram o hotel. Não havia rodado ainda quinhentos metros e já deparou com uma fila quilométrica de carros. Pressentiu que a viagem demoraria mais do que previra. Sabia que não adiantava se aborrecer com aquilo, pois, além de não resolver em nada, poderia deixar a si e, conseqüentemente, toda a família, mal-humorados. Assim, ligou o som num volume agradável e, enquanto esperava o avanço lento dos carros, acompanhava a música tamborilando o volante do carro com os dedos. O sol exibia todo o seu esplendor naquela tarde, embora já passasse das 16 horas. Da janela de seu carro assistia as pessoas literalmente se derreterem com o calor que fazia. Sentiu-se privilegiado por poder enfrentar o congestionamento naquele carro luxuoso e confortável, numa temperatura agradável, não obstante o calor do dia. Sentiu dó das pessoas que suportavam aquele tempo quente. Chamou-lhe a atenção os vendedores ambulantes que, aproveitando a fila dos carros, traziam em seus carrinhos, puxados à mão, grandes caixas térmicas recheadas de bebidas geladas a fim de oferecê-las aos que se preparavam para viajar. Era assim que eles ganhavam a vida. ‘Que dureza’, pensou doutor Fábio enquanto assistia as vindas e idas dos vendedores que passavam rentes aos carros empurrando suas cargas pesadas debaixo daquele sol escaldante. Chamou-lhe a atenção um deles que, calculou o doutor, deveria ter no máximo trinta anos. Ele vestia uma bermuda e uma camiseta regata que estava colada no corpo de seu dono devido ao suor. Calçava um chinelo de dedo, um pouco já gasto, e levava uma grande caixa térmica sobre uma armação com duas pequenas rodas, muito usada pelos vendedores ambulantes. Resolveu comprar algumas bebidas, mais por compaixão do que por sede. Do outro lado da rua, acompanhando a outra fila de carros, uma mulher, também vestida de maneira simples, também ganhava a vida do mesmo jeito. Dr. Fábio olhou de relance para sua família, e sentiu-se grato pela sorte com que fora agraciado e esboçou um leve sorriso de contentamento. Não nos detenhamos na viagem cansativa da família. Seis horas depois eles chegaram são e salvos à luxuosa residência da família. As crianças foram atendidas pelas empregadas que atenderam-nas assim que o carro estacionou na garagem. A família, depois de um merecido banho, sentou-se à mesa para uma leve refeição. Enquanto as crianças foram levadas para seus respectivos quartos, a mulher tratou de preparar as coisas para o dia seguinte, pois entrava no serviço às oito horas da manhã, e literalmente se atirou na cama. Era o que pretendia fazer o doutor Fábio. Antes, porém, como era seu costume, foi verificar suas correspondências eletrônicas. Uma delas o comunicava que ele deveria presidir a reunião que haveria no dia seguinte em lugar de seu superior que, a pedido da empresa, estava em viagem para uma reunião de negócios com clientes de outro país. Três horas depois, após reunir todas as informações para o compromisso do dia seguinte, pode o doutor Fábio se recolher – ou quase ser recolhido – ao seu aposento.
Voltando à cidade litorânea, onde iniciou a nossa história, encontramos o Pompeu e a Letícia, casal de vendedores ambulantes observados pelo doutor Fábio. Os dois trabalharam sem parar até por volta das vinte horas, quando o número de veículos e o clima não justificavam mais a permanência dos vendedores ali. Depois de tomaram um banho de água fria, colocaram uma roupa leve e foram à casa da dona Zulmira, mãe da Letícia, onde a família se reunia todos os domingos a fim de saborear uma deliciosa refeição, feita à base de frutos do mar. Era uma receita especial, passada de geração a geração desde a época da bisavó da avó da dona Zulmira. Aliás, o Lúcio, filho mais velho da dona Zulmira e um dos cozinheiros do hotel onde se hospedara o doutor Fábio e sua família, não cansava de elogiar esse prato ao chefe da cozinha que, para colocar os ‘pratos a limpo’, fui como convidado dele experimentar o prato tão aclamado pelo seu subordinado. Não é que ele tentou convencer dona Zulmira a ‘vender’ o segredo por um bom preço ao hotel? Isso ele não conseguiu, mas recebeu outro convite para, junto com sua família, voltar na semana seguinte para repetir o cardápio, o que ele aceitou imediatamente. Pois bem, depois que o casal se deleitar com o companheirismo dos seus e da comida da dona Zulmira, foi, como fazia todos os domingos, passear pela areia da praia. A noite estava agradável. Uma brisa, que vinha da direção do mar, contribuía para uma sensação de bem estar do casal, que caminhavam de mãos dadas. O mar, a praia, a areia, a pedra onde eles sentaram para apreciar as espumas das ondas iluminadas pela luz da lua, o murmúrio suave do mar, estavam à disposição do casal, que se sentia privilegiado por poder usufruir sem pressa, aquela ocasião tão singular!
Voltando à cidade litorânea, onde iniciou a nossa história, encontramos o Pompeu e a Letícia, casal de vendedores ambulantes observados pelo doutor Fábio. Os dois trabalharam sem parar até por volta das vinte horas, quando o número de veículos e o clima não justificavam mais a permanência dos vendedores ali. Depois de tomaram um banho de água fria, colocaram uma roupa leve e foram à casa da dona Zulmira, mãe da Letícia, onde a família se reunia todos os domingos a fim de saborear uma deliciosa refeição, feita à base de frutos do mar. Era uma receita especial, passada de geração a geração desde a época da bisavó da avó da dona Zulmira. Aliás, o Lúcio, filho mais velho da dona Zulmira e um dos cozinheiros do hotel onde se hospedara o doutor Fábio e sua família, não cansava de elogiar esse prato ao chefe da cozinha que, para colocar os ‘pratos a limpo’, fui como convidado dele experimentar o prato tão aclamado pelo seu subordinado. Não é que ele tentou convencer dona Zulmira a ‘vender’ o segredo por um bom preço ao hotel? Isso ele não conseguiu, mas recebeu outro convite para, junto com sua família, voltar na semana seguinte para repetir o cardápio, o que ele aceitou imediatamente. Pois bem, depois que o casal se deleitar com o companheirismo dos seus e da comida da dona Zulmira, foi, como fazia todos os domingos, passear pela areia da praia. A noite estava agradável. Uma brisa, que vinha da direção do mar, contribuía para uma sensação de bem estar do casal, que caminhavam de mãos dadas. O mar, a praia, a areia, a pedra onde eles sentaram para apreciar as espumas das ondas iluminadas pela luz da lua, o murmúrio suave do mar, estavam à disposição do casal, que se sentia privilegiado por poder usufruir sem pressa, aquela ocasião tão singular!
Roberto Policiano