Roberto Policiano

12 de mai. de 2008

Atitude

Não cabia em si de tanto contentamento. Era seu primeiro dia naquele emprego. Era tudo que sonhara. Para a sua felicidade seu local de trabalho ficava a quatro quadras da estação do metrô, trajeto esse que poderia fazer a pé, contribuindo assim para a manutenção de seu condicionamento físico, coisa que fazia questão de fazer. O fato de não ter que tirar o carro da garagem e enfrentar o trânsito infernal da cidade onde morava, era outra vantagem bastante significativa. Não teria gasto nem com combustível nem com estacionamento, além de ficar com a consciência tranqüila por não contribuir com a poluição do ar nem com o aquecimento global. Além do mais, o período do novo trabalho não impediria de continuar a lecionar, a sua verdadeira paixão. Não teria nem que atravessar a rua ao sair do metrô, pois o lugar onde trabalharia ficava do mesmo lado da estação. A primeira semana foi uma maravilha. Tudo funcionou perfeitamente como planejara. Na semana seguinte deparou-se com um inconveniente – a construção de um edifício bem ao lado da estação do metrô. A movimentação de trabalhadores e máquinas se intensificou a cada dia. Dentro de duas semanas teve que dividir o espaço com máquinas, trabalhadores, água, lama, materiais que chegavam constantemente e pessoas que vinham e iam. Não deixou se intimidar com isso e procurou encarar tudo com normalidade. Havia o incômodo de ter que limpar os sapatos todas as vezes que chegava ao escritório, mas, pensava, a situação seria passageira. Num dia de chuva, quando deixou o local de trabalho e se dirigia para a estação do metro, com todo o cuidado a situação demandava, olhou acidentalmente para o outro lado da rua e não pode acreditar no que via – uma calçada limpa de desimpedida à espera de ser ocupada. Como não percebera isso antes? No dia seguinte, após sair da estação do metrô, atravessou a rua e, enquanto caminhava confortavelmente na calçada, não conseguiu parar de olhar para o outro lado da rua onde as pessoas caminhavam com dificuldades. Sentiu-se inteligente por estar do outro lado da rua. Enquanto caminhava refletiu sobre o assunto e chegou à conclusão que a rotina muitas vezes nos faz andar como autômatos. Era tão automático virar imediatamente à direita na saída da estação que, mesmo quando o caminho ficou ruim, continuou a andar por ele como se não houvesse alternativa. Quantas vezes não fazemos exatamente isso na vida? filosofou. Quantas vezes passamos desnecessariamente por situações incômodas sem ao menos aventarmos qualquer mudança. Às vezes basta ‘olhar para o lado’ e ‘mudar de calçada’. E foi filosofando assim que chegou sorridente e com os sapatos limpos ao seu local de trabalho. Entrou no escritório com a sensação de ser a criatura mais inteligente do mundo, simplesmente porque teve a ousadia de atravessar a rua e mudar de calçada.
Roberto Policiano

5 Comments:

At 10:48 PM, Blogger Camis said...

Lindo!

Boa Noite!

 
At 4:36 PM, Anonymous Anônimo said...

A partir de hoje vou olhar para os lados!
bjs

 
At 3:36 PM, Anonymous Anônimo said...

É bom estar sempre ligado. Gostei do texto.
Marcão

 
At 6:19 PM, Anonymous Anônimo said...

Legal! O negócio é 'mudar de calçada'.
bjs

 
At 5:13 PM, Anonymous Anônimo said...

Atitude é tudo.
bjs

 

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