Rei Arthur
Já vive naquele lugar por cerca de um ano. Anda pelas mesmas ruas e conta a mesma história a quem tiver disposto a ouvir, principalmente se lhe dão algo para comer ou beber. Ficou tão conhecido na região que lhe apelidaram de rei Arthur. Alguns lhe ofereceram serviços, mas ele agradece e, depois de deixar claro que um rei não foi feito para trabalhar, diz que não pode deixar de manter a guarda, pois seus soldados podem chegar a qualquer momento. Às vezes passa várias horas em cima de uma árvore que fica perto de sua cabana, por suspeitar ter visto um espião de tocaia perto de seu ‘palácio de campo’. Quando tem certeza que não há inimigos por perto, permanece o dia todo no banco da praça central do lugar e conta, para aqueles que ele confia, histórias mirabolantes sobre seu reinado. Suas conquistas, seus julgamentos, a bravura de seus soldados, a beleza de sua rainha, a eficiência e lealdade de seus ministros, a dedicação de seus servos, a grandiosidade de seu palácio, a imensidão de seu país, o tamanho de seu tesouro, e o que mais lhe vier à sua mente doentia. Certa vez ele me descreveu o seu castelo com detalhes tão impressionantes que quase me convenceu que estava comentando algo real.
Seus olhos, inquietos, inspiram convicção. Seu andar e sua postura são, creiam-me, dignos de um soberano. Transmite confiança quando fala sobre sua história. Nomeia cada um dos nobres de seu reinado. Até mesmo quando come ou bebe algo que lhe é servido, não o faz com sofreguidão, mas de um modo bastante digno.
Sempre demonstrou uma disposição feliz, mas aquele dia, um domingo, estava com um semblante bastante jovial. Sorriu quando me viu e pediu que eu sentasse um pouco ao seu lado, pois tinha boas notícias de seu reino e queria compartilhá-las comigo. Como tinha tempo, pois ainda era cedo, cerca de seis horas da manhã, resolvi atender ao seu pedido.
- Queria me despedir de você.
- Para onde você vai?
- Partirei para o meu reinado.
- E a missão especial?
- Está concluída. A rainha foi resgatada em boa saúde, os inimigos foram eliminados, e meus soldados estão a caminho para me buscar. Não lhe disse? Aí estão eles!
Ao olhar para o lugar apontado por ele não queria acreditar no que meus olhos viam. Uma magnífica carruagem estava estacionada no lado oposto da praça. À frente dela seis cavalarianos, atrás outros seis deles. Uma portinhola do veículo se abriu e três distintos cavaleiros, ricamente trajados, desceram e se dirigiram diretamente para o rei Arthur. Depois de se curvarem com reverência por três vezes, disseram:
- A carruagem está pronta, majestade. Partiremos quando desejar.
Imediatamente sua alteza foi conduzida até a carruagem, não antes de se despedir da minha pessoa. Fiquei assistindo boquiaberto a partida magnífica do rei e seus súditos, quando, de repente, aconteceu algo mais espetacular ainda. Aquele grupo incomum começou a se elevar até desaparecer num galope magnífico por detrás de uma nuvem alaranjada pelo reflexo do sol da manhã.
Desde então muitos tem procurado o rei Arthur. Fizeram uma varredura no rio na tentativa de achar seu corpo. Vasculharam cada lugar do local, mas tudo em vão. Eu bem que pensei em contar o que vi, mas, pensando bem, desisti. Quem acreditaria no meu relato?
Roberto Policiano