Roberto Policiano

11 de dez. de 2013

Escultura



 
O escultor trabalhava animado, pois percebia que aquele trabalho era, na realidade, uma obra prima – um cavalo empinado com a crina esvoaçada pelo vento. Ficava extasiado à medida que a peça ia ganhando forma. Inebriava-se com cada detalhe adicional acrescentado. Quando a escultura ficou pronta não cansava de admirar sua própria obra. Manteve-a em destaque em seu atelier, sempre cuidando para eliminar qualquer poeira que se atrevesse a pousar sobre ela. Sua intenção era ficar com ela, mas outro admirador de arte, encantado com a grandiosidade da obra, ofertou por ela um valor irrecusável, principalmente em vista da situação financeira do artista que, com os olhos rasos d’água, entregou o cavalo ao comprador. Este, após admirar incansavelmente a primorosa peça durante duas semanas, tomando o mesmo cuidado adotado pelo artista, mandou que a mesma fosse embalada bela e ricamente, pois comprara para presentear a um amigo bastante achegado. O felizardo, depois de efusivos agradecimentos, pegou a peça de arte com cuidado e a depositou numa redoma de vidro que estava, por sua vez, num pedestal dourado na sala de estar. No entanto, assim que o amigo deixou o ambiente, o cavalo foi retirado da posição de destaque e entregue para ser colocado no depósito de coisas inservíveis onde ficou esquecido por muito tempo em uma prateleira. Anos depois foi descartado e enviado a uma loja de objetos usados onde fora colocado entre outras quinquilharias. Com o passar do tempo ganhou camadas e mais camadas de poeira até que seu brilho foi ofuscado pelo descuido e abandono. Quem via aquele objeto  entre tantos outros jamais conseguiria enxergar a sua história. Mas um senhor que passou por lá o avistou. Sua visão, embora já turva pela idade, percebeu imediatamente o valor da peça. Entrou até a loja e, disfarçando seu interesse, perguntou os preços de várias coisas que estavam expostas, até chegar ao cavalo. Admirou-se ao saber do preço e, sem perder tempo, comprou-o. Caminhou apressadamente, não obstante sua idade. Um não sei quê de felicidade apoderou-se dele. Ao chegar a casa desembrulhou a obra com cuidado e imediatamente começou a restaurá-la. Limpou cuidadosamente cada milímetro até livrá-la do pó acumulado de todos os anos. Pegou uma lixa extremamente fina e deslizou-a delicadamente sobre a peça sem nenhuma pressa. Depois de vários dias de trabalho paciente colocou a escultura sobre as palmas de suas mãos e, erguendo os braços, girou a obra vagarosamente até perscrutar cada ponto dela. Sorriu satisfeito. Colocou-a num lugar especial em sua sala de estar e, depois de acariciá-la cuidadosamente com uma flanela, sentou-se em sua poltrona e ficou um bom tempo a admirá-la.


Roberto Policiano