Escultura
O escultor trabalhava animado,
pois percebia que aquele trabalho era, na realidade, uma obra prima – um cavalo
empinado com a crina esvoaçada pelo vento. Ficava extasiado à medida que a peça
ia ganhando forma. Inebriava-se com cada detalhe adicional acrescentado. Quando
a escultura ficou pronta não cansava de admirar sua própria obra. Manteve-a em
destaque em seu atelier, sempre cuidando para eliminar qualquer poeira que se
atrevesse a pousar sobre ela. Sua intenção era ficar com ela, mas outro admirador
de arte, encantado com a grandiosidade da obra, ofertou por ela um valor
irrecusável, principalmente em vista da situação financeira do artista que, com
os olhos rasos d’água, entregou o cavalo ao comprador. Este, após admirar
incansavelmente a primorosa peça durante duas semanas, tomando o mesmo cuidado
adotado pelo artista, mandou que a mesma fosse embalada bela e ricamente, pois
comprara para presentear a um amigo bastante achegado. O felizardo, depois de
efusivos agradecimentos, pegou a peça de arte com cuidado e a depositou numa
redoma de vidro que estava, por sua vez, num pedestal dourado na sala de estar.
No entanto, assim que o amigo deixou o ambiente, o cavalo foi retirado da
posição de destaque e entregue para ser colocado no depósito de coisas
inservíveis onde ficou esquecido por muito tempo em uma prateleira. Anos depois
foi descartado e enviado a uma loja de objetos usados onde fora colocado entre
outras quinquilharias. Com o passar do tempo ganhou camadas e mais camadas de
poeira até que seu brilho foi ofuscado pelo descuido e abandono. Quem via
aquele objeto entre tantos outros jamais conseguiria enxergar a sua
história. Mas um senhor que passou por lá o avistou. Sua visão, embora já turva
pela idade, percebeu imediatamente o valor da peça. Entrou até a loja e,
disfarçando seu interesse, perguntou os preços de várias coisas que estavam
expostas, até chegar ao cavalo. Admirou-se ao saber do preço e, sem perder
tempo, comprou-o. Caminhou apressadamente, não obstante sua idade. Um não sei
quê de felicidade apoderou-se dele. Ao chegar a casa desembrulhou a obra com
cuidado e imediatamente começou a restaurá-la. Limpou cuidadosamente cada
milímetro até livrá-la do pó acumulado de todos os anos. Pegou uma lixa
extremamente fina e deslizou-a delicadamente sobre a peça sem nenhuma pressa.
Depois de vários dias de trabalho paciente colocou a escultura sobre as palmas
de suas mãos e, erguendo os braços, girou a obra vagarosamente até
perscrutar cada ponto dela. Sorriu satisfeito. Colocou-a num lugar especial em sua sala de estar e,
depois de acariciá-la cuidadosamente com uma flanela, sentou-se em sua poltrona
e ficou um bom tempo a admirá-la.
Roberto Policiano
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