Roberto Policiano

15 de out. de 2014

Goma de mascar




Terça-feira, aproximadamente onze horas e quarenta e cinco minutos. Ele andava apressado a fim de não perder a condução. Era verão e a temperatura estava condizente com a estação, de modo que sua camisa estava tão suada que grudava em seu corpo. De repente deu-se conta de que a goma de mascar que levava à boca há muito havia perdido seu sabor. Visto que a mascava em compasso com a velocidade com que caminhava, sentiu o impacto da mastigação em sua mandíbula. Sem pensar duas vezes cuspiu a borracha na palma da mão e livrou-se dela na lixeira de uma casa na esquina da avenida onde caminhada e uma pequena rua que iniciava exatamente ali. Na residência acontecia uma movimentação incomum e um falatório em volume acima do normal, mas o transeunte não se atentou a este detalhe.

À noite daquele mesmo dia, ao assistir o telejornal em sua casa, nosso caminhante ouviu uma notícia de um crime que acontecera no período da manhã. Para sua surpresa a casa onde passara em frente apareceu na tela da televisão. Comentou com a esposa que ele estivera na região da residência mais ou menos no horário do almoço.

O acontecimento ganhou gradativamente proporção significativa a ponto de chamar a atenção dos repórteres e dos munícipes. O atentado foi reconhecido como praticado por profissionais do crime, visto que nenhum vestígio fora encontrado. Isso fez com que a notícia se repetisse durante duas semanas, agora no horário nobre da programação televisiva, deixando de ser uma notícia local por alcançar o interesse da nação. Peritos em criminologia foram convocados para desvendar o caso.

Na quinta semana uma informação intrigante foi dada pela equipe que investigava o ocorrido - que já havia ultrapassado a barreira nacional e entrado em algumas nações vizinhas - que mostraram alguns lances do acontecimento. Um dos integrantes do crime - comentou um dos detetives - cometeu um pequeno deslize e deixou uma goma de mascar na lixeira da casa. Esse detalhe animaram os técnicos envolvidos no caso, pois o material fora encaminhado para um laboratório que faria exames no DNA da saliva da borracha a fim de identificar um dos membros da quadrilha e, por meio dele, chegar aos demais elementos criminosos.

Três semanas depois o caminhante foi visitado por dois agentes policiais e levado à delegacia que investigava o crime. O pobre homem tentou convencer as autoridades de que apenas passava no local, que fazia parte de seu trajeto diário, e jogara a goma de mascar na primeira lixeira que encontrara, mas sua explicação foi considerada inverossímil. O infeliz foi bombardeado de perguntas como: “Por que especificamente naquela lixeira?”; “Por que não na anterior?”; “Não poderia ser na posterior?”; “Não percebeu ali acontecera um crime?”; “Como não se dera conta da movimentação incomum?”; “Como não ouvira nada do que se dizia no interior da casa?”. O rapaz suava copiosamente, pois não sabia responder a nenhuma das perguntas acima e percebeu que a cada resposta não convincente se complicava cada vez mais.

Os telespectadores do país inteiro, bem como das nações fronteiriças, conheceram naquela noite um dos criminosos do caso intrigante até então. Os peritos informaram que ele não estava cooperando com as investigações, pois insistia em dizer que era inocente e de que não conhecia os outros autores do crime.

Um ano e meio depois a nação sentiu-se sossegada e tranquila ao saber que o réu fora condenado por um júri popular a vinte anos de prisão em regime fechado pelo seu delito e a outros dezoitos anos por acobertar os demais integrantes da quadrilha.

Em uma sala qualquer da nação um grupo, escondido por fumaças dos apreciados e famosos charutos de Havana, comemorava o veredicto com  requintado e genuíno vinho francês, apreciado no mundo inteiro, inclusive ali. Após efusiva e barulhenta algazarra o grupo se preparou para planejar a próxima ação criminosa.



Roberto Policiano