Roberto Policiano

22 de mar. de 2013

Lapidação



Dezessete de novembro de dois mil e doze, três horas e trinta minutos da madrugada. Acordou com uma pedra na cabeça. Não era uma pedra qualquer, mas, antes, uma pedra determinada, que parecia que sabia o que queria. Ela insistia em permanecer na cabeça de quem despertara naquela manhã e pedia, ou melhor, comandava, que se escrevesse a respeito de si. Como que para facilitar a escrita, a pequena rocha ora se mostrava, ora se escondia, a fim de direcionar a mente que deveria descrevê-la. Era como se dentro dela já houvesse uma pré-lapidação, que ela, ansiosa, tentava mostrar. Pareceu ao cérebro pensante que a pedra, não querendo ficar escondida entre outras pedras espalhadas no trajeto, lançava-se na ideia de quem despertara para assumir tal compromisso. Porém o corpo da mente desperta permanecia inerte no aconchego do cobertor naquela madrugada chuvosa. Mas quem dorme com uma pedra na cabeça? Assim, embora o corpo permanecesse estagnado, o cérebro começou a lapidar a pequena rocha, não como ele queria, mas conforme percebia na exibição da própria pedra, que literalmente se despia com a descarada intenção de sedução. E, gradativamente, aquele simples seixo deu lugar a uma gema interessante, sempre ao comando da pedra que, fenomenologicamente, se desvendava àquele a quem caiu a escolha para realizar o trabalho de lapidação. Enquanto o corpo permanecia adormecido e aconchegado à cama e devidamente agasalhado, o cérebro tirava lascas da pedra bruta com o mesmo cuidado de mãos treinadas que transformam diamantes brutos em belas e valiosas joias. Quando, por fim, a gema parecia quase completa, a mente ainda tentou fazer algumas aparas aqui e ali, mas, sob o comando da ex-pedra, que agora exibia seus contornos desejados, parou no ponto onde fora ordenada, restando-lhe a missão de nomear a obra de arte recém-formada. E, depois de uma reflexão sobre o trabalho a que foi conduzida naquela madrugada, batizou o resultado de “Pedra fenomenológica”.

Dezessete de novembro de dois mil e doze, oito horas e quarenta e três minutos. O corpo, agora plenamente desperto, digitava o texto acima sob o comando da mente que procurava transmitir às mãos os detalhes do seixo lapidado e cuidadosamente guardado para ser registrado nesta crônica.
 
Roberto Policiano